segunda-feira, março 08, 2004

Adeus

Paramos no cimo da ponte. A vista é fenomenal! Ao longe o sol vai descendo por trás das montanhas, enorme e vermelho-vivo, cor de fogo. Mais abaixo vemos o rio, serpenteando e correndo rapidamente por entre as rochas. A paisagem inspira-me e sinto-me bem. Queria partilhar este momento contigo para o resto da vida. Mas tu não estás para aí virada. Não te queres prender a mim como eu pretendo. Gracejo que se não ficas comigo me atiro da ponte... Tu dizes para me deixar de parvoíces. Salto para o bordo da ponte, apenas seguro por uma mão. Começas a ficar aflita. Pedes que volte para o tabuleiro. Penso que finalmente viste que sem mim não consegues viver. Volto para trás. Também não saltava... Tenho medo de ficar longe de ti, de me afastar e depois não te conseguir recuperar, se é que alguma vez te tive! Abraço-me a ti. Tento-te beijar, mas viras a cara. Como estava enganado. Apenas querias que voltasse porque te dá jeito um escravo particular; alguém que por te amar tanto te faz as vontades todas e nem reclama quando o afastas. Apenas me pediste para voltar porque achas que não ficas bem de preto e por isso não te apetece vestir assim por teres de ir ao meu funeral! Estou farto! Farto desta vida de merda, de me sujeitar a tudo o que queres e de dizer que sim a todas as tuas barbaridades. De fingir que acho graça às tuas piadas, de suportar o teu mau feitio e a tua mania de que todos são injustos para contigo! Afasto-te. Chega! Tentas-me agarrar mas eu não te deixo. Adeus! Começo a correr para o bordo da ponte. Num movimento perfeito apoio o pé no limite e salto. Ao mesmo tempo que dou o último impulso olho para baixo. O rio corre lá em baixo, longe, com um estranho brilho vermelho do sol, vermelho de sangue. Toda a minha vida contigo descorre-me rapidamente pela cabeça. Todos os bons momentos que vivemos juntos. Amava-te tanto! Mas depois começo a ver no que a minha vida se estava a tornar. Tinha-me tornado em mais uma figura desse jogo que tanto adoras. Mais um boneco que controlavas à tua vontade. Isso estava-me a deixar à beira da loucura! Prefiro morrer a tornar-me num autómato! Quando já estou em queda livre, começo-me a sentir leve, mais leve que nunca. Será que morri e não me apercebi disso? Terei sofrido um ataque cardíaco? Não. Apenas tirei um grande peso da consciência. Sinto-me como um passarinho que fugiu da gaiola e agora voa livre pelos céus. Vejo-te em cima da ponte, num misto de raiva e desespero, sentindo que me perdeste e que provavelmente não me voltarás a recuperar. Será que alguma vez te apercebeste que o teu futuro estava ali, naquele pobre mortal que te tratava como uma deusa? Não creio. Haverá vezes em que sentirei falta dos teus carinhos, de estar contigo, de tudo o que partilhámos? Claro que sim, mas o tempo ajudar-me-à a esquecer, penso eu enquanto flutuo para longe, bem longe... Será que me voltarão a prender?