terça-feira, agosto 30, 2005

hard core

"Geme mal

Geme teatralmente na cama

Com os lábios sobrecarregados de baton

E sobrancelhas enlameadas de rimel

A madame filipa da cultura

Nem num local idílico

Tal megera

É capaz de ser autêntica

(aquisições vulgares)

Nos bordéis de odores

Os perfumes

Acusam de forma implícita

Os que cheiram mal

Tudo isto mete nojo

Remeto-vos para

Toda aquela gente chunga

Engravatada e misturada por

Todos aqueles odores nauseabundos

Com que julgam disfarçar os fatos

De cortes clássicos

A lembrar a rectidão dos antepassados

Nas repartições públicas

Funcionários

Reprimem os desejos

Evitam a custo

O dedo no nariz e o

Cuspir para o chão

Nas latrinas do estado

Receiam de forma cobarde

Os superiores e falam

Falam essas gentes de coragem

De moral, de ética, de civismo

Num acto de superioridade

Limpam das bocas subtis a palavra povo

E de facto

É um facto relevante

O facto de há muito não

Vos ver prostituir em troca dos tostões

Cheiram mesmo mal

... tão mal

Eterna parolada e saloiada

Chamar-vos todos os nomes

É pouco continuariam a não existir

... esquivam-se tão bem

Aos rótulos

Venham e tragam flores

Se ainda as houver

Venham e toquem-me

Pode ser que sinta

E que me façam crer

Que estão aqui

Não reprimas

Não disfarces a tua

Real natureza de ser

Mostra a decência

E mata

Mata, mata, Mata

Sempre que te apetecer

É o que te estão a fazer

Profissionalmente

Não estranhas naqueles bonecos

A mobilidade dos olhos

Que lhes desnuda a fraqueza e

A debilidade que os caracteriza?

Não te fode a cabeça

Ver todas aquelas marionetas

Abrir as bocas

E a este acto pernicioso e

Subvertido

Juntar-se-lhe uma enxurrada

De perdigotos

Que subtilmente inquinam

O ar que respiras?

Há muito

Que bateram no chão

Estão caídos – assobiem

Estão caídos – batam palmas

Estão caídos – dêem saltos

Já desinibido

Dirige-te aos locais solenes

(ah os locais solenes)

Que te fragilizam e subjugam

Que te fazem parecer sem ser

Mas, chama-me que eu parto contigo


Chama-me e

Que haja duplos triplos

Quintuplos sentidos

Nas putas das palavras

Partiremos por ir

Partiremos por voltar

Partiremos por subir

Desmontar rodopiar quebrar

Há que partir há que partir!

Não é necessário dizermos

Foda-se nem caralho

Nem tão pouco chamá-los de

Filhos da puta

Para lhes cativarmos a atenção

Utilizemos outro vocabulário

E digam digam

Estamos caídos – reivindiquem

Estamos caídos – partam

Estamos caídos – matem

... se o fim acabasse

Seria para sempre um presente irreal"


Luís Simões in brochura Rascunho

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